quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

O universo em gama

Rede de telescópios vai unir países – inclusive o Brasil – na difícil tarefa de capturar luz gerada por raios cósmicos ao interagir com átomos terrestres. Além de expandir o conhecimento sobre as fontes desses raios, o projeto pretende desvendar outros mistérios espaciais.


Exatos 60 anos depois de um astrofísico britânico apontar para o espaçoem uma noite sem luar, uma lata de lixo dotada de um espelho em seu fundo e de um sensor de luzem sua abertura, um projeto internacional inicia sua jornada para, em essência, fazer omesmo que aquele equipamento peculiar: observar o céu para desvendar a origem de invasores cósmicos. O Brasil participa do experimento.
O CTA (sigla, em inglês, para Rede de Telescópios Cherenkov) será formado por dois conjuntos (um no hemisfério Norte; outro no Sul) de telescópios – apesar do nome, são, na verdade, espelhos côncavos gigantescos, com formato de antenas parabólicas.
Guardadas as proporções, a função das duas redes de telescópios do CTA será a mesma daquela lata de lixo – talvez, a mais famosa da história da ciência –, concebida e instalada por John Jelley (1918-1997): capturar a luz extremamente tênue gerada pela interação da radiação cósmica com átomos da atmosfera terrestre. No casoos invasores são os raios (ou radiaçãogamaos membros mais energéticos da família das ondas eletromagnéticas, que inclui também as ondas de rádio, as micro-ondas, oinfravermelho, a luz visível, o ultravioleta e os raios X.


A chegada de um raio gama no alto da atmosfera dá início a uma cascata de partículas (basicamente, elétrons e pósitrons) que, por sua vez, geram mais raiogamaem um processo que se multiplica por quilômetros, até atingir o solo. Rumo ao chão, essa chuveirada subatômica emite, por viajar com velocidade maior que a da luz no ar, um tipo de radiação (luz) denominada Cherenkov – homenagem ao físico soviético Pavel Cherenkov (1904-1990), que levoo Nobel de Física de 1958 pela descoberta dofenômeno.
Ao observar esses flashes extremamente rápidos – duram cerca de 3 bilionésimos de segundo – e invisíveis para o olho humanoos telescópios do CTA poderão apontar com precisão nunca atingida as fontes no céu emissoras de radiação gama. Esse equipamento não poderá trabalhar em noites muito claras, pois a luz do luar ofusca – e pode até queimar – os detectores de luz (fotomultiplicadoras), extremamente sensíveis.

Dez vezes mais sensíveis

No hemisfério Sul, os telescópios do CTA irão se espalhar por uma área de 10 km2 e estarão voltados para caçar galáxias distantes emissoras de raiogama. No Norte,ocuparão 1 km2, e o alvo serão fontes galácticas que funcionam como aceleradores de partículas de altíssimas energias.
Cada rede será composta por telescópios grandes (24 m de diâmetro), médios (12 m) e pequenos (6 m). Estes últimos ficam na periferia da área ocupada pela rede, mas sãoos responsáveis por capturar a luz Cherenkov gerada pelos raiogamaultraenergéticos.
Em conjunto, as duas redes pretendem multiplicar por 10 a sensibilidade de outrosobservatórios terrestres semelhantes, como o H.E.S.S. (Namíbia), o Magic (Ilhas Canárias) e o Veritas (EUA). O CTA pretende localizar cerca de mil fontes dessa radiação, contra as cerca de 150 hoje conhecidas.

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